O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) condenou a Federação Brasileira das Cooperativas de Especialidades Médicas (Febracem) e algumas cooperativas médicas do Espírito Santo, além de quatro pessoas físicas, por coordenarem ações consideradas anticompetitivas que manipulavam o mercado de serviços médicos no Espírito Santo, principalmente envolvendo contratos com hospitais públicos.
Como resultado do processo, em julgamento realizado no último dia 25, foram impostas diversas penalidades pelo Cade. A Febracem foi multada em quase R$ 4 milhões, além de ficar proibida de representar cooperativas médicas ou celebrar contratos com o poder público pelo prazo de cinco anos.
As cooperativas, por sua vez, receberam multas que variam entre R$ 1,7 milhão e R$ 14,5 milhões. As pessoas físicas envolvidas foram multadas entre R$ 27.409,37 e R$ 396.802,89. Ao todo, as multas aplicadas somam mais de R$ 40 milhões.
Além das multas, as entidades condenadas deverão publicar um extrato da condenação em seus sites por 30 dias e enviá-lo a seus cooperados, sob pena de multas diárias de R$ 50 mil para as entidades e R$ 10 mil para os indivíduos.
As cooperativas condenadas no processo são:
– Coopanestes – Cooperativa de Anestesiologia do Estado do Espírito Santo
– Cooperati – Cooperativa dos Médicos Intensivistas do Espírito Santo
– Cooplastes – Cooperativa dos Cirurgiões Plásticos do Estado do Espírito Santo
– Coopergices – Cooperativa dos Cirurgiões Gerais do Estado do Espírito Santo
– Coopercipes – Cooperativa dos Cirurgiões Pediátricos do Estado do Espírito Santo
– Coopneuro – Cooperativa dos Neurocirurgiões do Estado do Espírito Santo
– Coopangio – Cooperativa dos Angiologistas e Cirurgiões Vasculares do Espírito Santo
Ainda foram condenadas a Sociedade Brasileira de Neurologia (SBN) e a Federação Brasileira das Cooperativas de Especialidades Médicas (Febracem).
O Conselho Regional de Medicina (CRM) também chegou a fazer parte do processo. Mas o Cade avaliou que não há evidências de que a entidade tenha prejudicado a concorrência do mercado e arquivou o caso.
Entenda a denúncia
A denúncia foi apresentada pela Associação Evangélica Beneficente Espírito-Santense (Aebes), fundadora do Hospital Evangélico de Vila Velha, que alegou que a Febracem e as cooperativas usaram sua posição dominante para impor condições comerciais prejudiciais, controlando cerca de 75% dos atendimentos de urgência e emergência do Estado, com cerca de 1.500 médicos.
As investigações revelaram que as cooperativas, sob a liderança da Febracem, adotaram práticas abusivas, como recusa de prestação de serviços médicos, ameaças de paralisação, boicotes e criação de barreiras para impedir a entrada de novos profissionais no mercado. Na decisão, também há descrição de que a Febracem teria promovido campanhas difamatórias contra organizações sociais e Secretaria de Saúde (Sesa). Táticas que visavam aumentar o poder de barganha nas negociações com o governo do Espírito Santo.
De acordo com o conselheiro Gustavo Augusto, relator do caso, a investigação encontrou evidências de coordenação entre as entidades para limitar a concorrência no mercado de serviços médicos. Apesar de já terem sido alvo de investigações anteriores pelo Cade, que resultaram em condenações e Termos de Compromisso de Cessação (TCCs), as práticas anticompetitivas persistiram sob o amparo da Febracem, segundo o Cade.
No documento, o relator frisa que a priori é lícito que as cooperativas negociem uma melhor remuneração e maior faturamento em nome dos cooperados. Mas ele destacou que, contudo, entende que a reunião de distintas cooperativas em uma federação como forma de pressionar a negociação com o governo estadual e incentivar a adoção de uma conduta comercial uniforme por sociedades empresárias distintas pode caracterizar uma infração à ordem econômica, se não estiver devidamente justificada pela regra da razão.
O relator considerou que a conduta das cooperativas limitou acesso de novos profissionais ao mercado e criou dificuldades ao desenvolvimento das atividades de médicos concorrentes.
O relatou ainda listou práticas consideradas anticompetitivas, que podem caracterizar uma infração à ordem econômica:
– a tentativa de impedir que o poder público contrate médicos residentes em outros estados,
– o lançamento de campanha difamatórias,
– a imposição de unimilitância; o boicote à contratação individual de médicos por hospitais, fora de cooperativas,
– o boicote à contratação individual de médicos por meio de processo seletivo público,
– o incentivo ou a intimidação de terceiros para que se recusem a prestar serviços dentro das condições de pagamento normais, aos usos e costumes comerciais,
– e a tentativa de impedir a contratação por clínicas e hospitais de médicos não cooperados.
O que dizem os envolvidos
A Associação Evangélica Beneficente Espírito-Santense (Aebes) respeita o trabalho do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e está acompanhando as decisões do processo.
A Secretaria da Saúde (Sesa) informa que todos os processos de contratação realizados pelo órgão são realizados com base em critérios alinhados à legislação vigente, sempre em defesa da livre concorrência e comprometidos com a oferta de um serviço de saúde público de qualidade para a população.
A Sesa assegura a transparência e integridade em cada etapa, independentemente da modalidade de contratação, e mantém o compromisso com as boas práticas de gestão e no investimento contínuo na humanização dos serviços prestados, garantia do acesso digno e eficiente aos cidadãos capixabas.
A respeito do assunto, o CRM informou que, no processo administrativo 08700 002124/2016-10, o CRM-ES foi absolvido. Os conselheiros do Cade reconheceram, por unanimidade, que o Conselho agiu dentro dos seus limites legais.
As cooperativas médicas, com exceção da Coopneuro, são registradas no Sistema OCB/ES e, via entidade, informaram que, por orientação das equipes jurídicas, as cooperativas não comentarão processos em andamento.
Já a Sociedade Brasileira de Neurocirurgia aguarda o esclarecimento (deslinde) do processo e acredita na Justiça. As demais entidades foram procuradas, mas os responsáveis não foram localizados para comentar a condenação.