Nos últimos 30 dias, o Hospital Estadual de Urgência e Emergência (HEUE), em Vitória, registrou um número recorde de captações de órgãos. A marca, que supera os dados dos últimos 12 meses, inclui 14 córneas, 2 fígados, 4 rins e 2 corações — sendo que a captação cardíaca não era realizada há quase dois anos na unidade. Em 2025, já são três corações captados, sendo dois deles nos meses de março e abril.
De acordo com Tamires Vieira Silva, Enfermeira Coordenadora da Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplantes (CIHDOTT), esse avanço se deve a uma combinação de fatores, incluindo a mobilização das equipes envolvidas e o fortalecimento da articulação entre os hospitais e as centrais de transplantes.
Além da estrutura e logística, a coordenadora destaca que a forma como a abordagem às famílias é feita também influencia diretamente nos resultados positivos. “É sempre um processo cuidadoso, individualizado, em ambiente calmo e com profundo respeito às demandas de cada família. Envolvemos a equipe multiprofissional — enfermeiros, assistente social, psicólogo e capelania — para garantir que esse momento seja acolhedor e humanizado, dentro das possibilidades”, afirma.
Segundo ela, embora não tenha havido uma campanha pública específica nas últimas semanas, o fortalecimento das ações internas tem feito a diferença.
“A atuação integrada entre hospital, central estadual de Transplantes e banco de olhos tem sido essencial. O diálogo constante e o preparo técnico garantem que, quando surge a possibilidade, tudo ocorra dentro do tempo ideal”, detalha.
Captação de coração ainda é um desafio
Apesar do bom desempenho no último mês, a captação de coração ainda é considerada uma operação complexa e excepcional. Tamires explica que o órgão precisa ser retirado e transplantado em um intervalo de tempo muito curto, além de exigir condições específicas do doador.
“Não é qualquer caso que permite a captação de coração. Os critérios são rigorosos, e o tempo para transporte e cirurgia é muito limitado. Isso faz com que essa captação exija uma logística muito precisa e uma equipe altamente treinada, envolvendo muitas vezes o apoio da Guarda Municipal ou da Força Aérea Brasileira (FAB)”, pontua.
A importância da doação: um gesto que salva vidas
Para que esse trabalho continue avançando, a conscientização da população é fundamental. A recusa familiar ainda é um dos principais obstáculos enfrentados pelas equipes de captação.
A doação só é possível quando um familiar de 1º ou 2º grau autoriza. Mesmo que a pessoa tenha registrado em documento o desejo de ser doador de órgãos, a captação só é realizada com o consentimento e a assinatura de um familiar. Por isso, é muito importante conversar sobre esse desejo em vida, deixando claro que você quer ser doador — isso facilita a decisão final, que precisará ser tomada por alguém próximo, como um filho, a mãe ou o cônjuge, por exemplo. “Esse gesto pode salvar até oito vidas”, reforça Tamires.
Ela lembra que, mais do que números, cada captação representa a chance de um recomeço para pessoas que esperam por um transplante.
Esse cuidado feito a muitas mãos, segundo ela, é tomado em quase todas as abordagens, seja para córneas ou múltiplos órgãos. “Quando conseguimos oferecer acolhimento verdadeiro, a chance de uma resposta positiva por parte da família é maior”, completa.
Dados
Segundo dados atualizados até esta quinta-feira (11) pelo Sistema Nacional de Transplantes, 2.606 pessoas aguardam por um órgão no Espírito Santo. A maior parte delas, 1.460 pessoas, espera por córneas. Em segundo lugar está o rim, com 1.098 pacientes na fila. Outras 42 pessoas aguardam por um fígado e seis pessoas esperam por coração na fila de transplante.