Mesmo proibido, o cigarro eletrônico é amplamente utilizado no país. É só circular em bares, casas de shows e outros espaços de entretenimento que é possível avistar, não apenas um, mas vários usuários do produto. Não bastasse o mal que causa à saúde, os chamados Dispositivos Eletrônicos de Fumar (DEFs) provocam danos também aos cofres públicos. No Espírito Santo, estima-se um prejuízo de mais de R$ 100 milhões por ano, decorrente do comércio ilegal.
O valor é uma estimativa apontada em estudo da Escola de Segurança Multidimensional (ESEM), do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da Universidade de São Paulo (USP). No cálculo são considerados os impostos estaduais e federais que incidem sobre os cigarros convencionais — os mesmos tributos seriam aplicados nos eletrônicos, caso fossem legalizados — e projeções do mercado consumidor brasileiro, tendo como base levantamento da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG). E os indicadores apontam para um crescimento do consumo.
Coordenador da ESEM-USP, o professor Leandro Piquet Carneiro explica que a escola tem um programa usado para pesquisar a infiltração de organizações criminosas em cadeias produtivas nos mais diversos setores, como o de combustíveis, defensivos agrícolas, ou fraudes no sistema bancário. É um trabalho que analisa o processo de captura de negócios legais por criminosos. No caso dos cigarros eletrônicos, no entanto, há uma “zona cinzenta” porque o comércio não é legalizado no país.
O fato de não haver regulamentação para a venda do produto não impede a circulação no país, mas, ao contrário, favorece a atuação dos grupos criminosos, observa Piquet.
“A ilegalidade favorece a distribuição de produtos muito mais nocivos e sem nenhum controle. Quando há legalização, as empresas são parceiras do governo na regulamentação. Essa cooperação de empresa e governo não existe no regime de proibição”, sustenta o professor, acrescentando que, com a regulamentação, é estabelecida a devida tributação e o Estado passa a garantir receita nesse comércio.
A venda e a publicidade dos cigarros eletrônicos são proibidas desde 2009 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que, neste ano, revisou as normas e decidiu manter o produto vetado no país, expandindo a proibição para a fabricação e transporte. O professor Leandro Piquet reconhece os danos à saúde causados pelos DEFs, mas lembra que a proibição não tem impedido os usuários de adquiri-los, tampouco a atuação de organizações criminosas.
“Sempre haverá um custo para a sociedade, mas o custo da proibição é muito alto porque gera oportunidade e alimenta essas organizações. É sempre um dilema ter que lidar com mais problemas de saúde pública, mas há vitórias importantes na segurança”, argumenta.
Neste ano, a Polícia Federal fez duas apreensões de cigarros eletrônicos em Vitória, retirando de circulação pouco mais de 1,4 mil unidades do produto. Mas, segundo a assessoria do órgão, não é possível dar informações sobre investigações em andamento. Já a Polícia Civil não atua mais na área porque foi orientada pelo Ministério Público e Judiciário de que o enfrentamento a esse crime é federal. A Receita Federal também foi procurada para se manifestar sobre sua atuação, mas não deu retorno até a publicação desta reportagem.
Para Leandro Piquet, o estudo pode servir para o debate público sobre os caminhos que o país deverá adotar em relação ao cigarro eletrônico. No Congresso Nacional, há projetos que discutem a regulamentação e a criminalização do produto.