As defesas de sete condenados por integrarem o núcleo central da trama golpista, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), protocolaram recursos no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta segunda-feira (27), data limite para as apelações. Nos chamados embargos de declaração, os advogados apontam supostas omissões, contradições e erros processuais no julgamento da Primeira Turma, além de questionarem o cálculo das penas aplicadas.
Entre os oito condenados do núcleo, apenas a defesa do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, optou por não apresentar este tipo de recurso.
Os embargos de declaração são um mecanismo legal que busca esclarecer pontos da decisão judicial considerados obscuros, contraditórios, omissos ou que contenham erros materiais. O objetivo principal das defesas é tentar reduzir as penas impostas, que variam de 16 a 27 anos de prisão. Conforme apurou a Folha de S.Paulo, uma das teses centrais levantadas é que o crime de golpe de Estado deveria absorver o de abolição do Estado Democrático de Direito, o que poderia diminuir as sentenças em cerca de oito anos.
Os réus que recorreram são: Jair Bolsonaro, Walter Braga Netto (general e ex-ministro), Almir Garnier Santos (almirante e ex-comandante da Marinha), Augusto Heleno (general e ex-chefe do GSI), Paulo Sérgio Nogueira (general e ex-ministro da Defesa), Alexandre Ramagem (deputado federal e ex-diretor da Abin) e Anderson Torres (ex-ministro da Justiça).
O que alegam as defesas
Os argumentos apresentados nos recursos variam entre erros processuais, questionamentos sobre provas e discordâncias no cálculo das sentenças (dosimetria).
Jair Bolsonaro
A defesa do ex-presidente, condenado a 27 anos e três meses, alega que houve “múltiplos cerceamentos” de defesa durante o processo. Segundo a Agência Brasil, os advogados argumentam que não tiveram tempo hábil nem acesso adequado às provas, citando 70 terabytes de dados que teriam impossibilitado o exame completo do material.
O recurso também aponta contradições na avaliação da credibilidade da delação premiada de Mauro Cid e na análise da participação de Bolsonaro nos fatos. A defesa cita nominalmente o ministro Luiz Fux, único a votar pela absolvição, diversas vezes. Segundo a CartaCapital, os advogados alegam que o voto divergente de Fux “reforça essa necessidade de exame dogmático rigoroso, reconhecendo o risco de excesso acusatório”.
Os advogados também questionam o cálculo da pena, afirmando, segundo a Agência Brasil: “Não se sabe, portanto, o que significou cada uma das circunstâncias consideradas, pelo Ministro Relator, como ‘amplamente desfavoráveis’. É indiscutível que a partir da existência de circunstâncias valoradas negativamente chegou-se, sem qualquer cálculo… ao elevado aumento da sanção”.
Walter Braga Netto
A defesa do general, condenado a 26 anos, argumenta que o processo foi marcado por “falta de imparcialidade” e “cerceamento de defesa”, conforme a Agência Brasil. Os advogados alegam que o relator, ministro Alexandre de Moraes, teria adotado uma “postura inquisitória”. A defesa pede a anulação da delação de Mauro Cid, alegando que o colaborador teria sido coagido, e aponta um erro material na soma da pena. Segundo a CartaCapital, os advogados justificam que a somatória correta seria de 25 anos e 6 meses, e não 26 anos.
Outros réus
Augusto Heleno: O ex-chefe do GSI pede absolvição, alegando que sua conduta foi “meramente acessória e periférica”. Caso a condenação seja mantida, pede redução da pena por “participação de menor importância” e diminuição da multa de R$ 126 mil para R$ 23 mil. A defesa também cita o voto de Luiz Fux.
Paulo Sérgio Nogueira: O ex-ministro da Defesa pede absolvição, justificando que o próprio acórdão “reconheceu que o embargante agiu para diminuir o risco ao bem jurídico”. A defesa também alega erro no cálculo da pena, afirmando que a soma correta totaliza 16 anos e 4 meses, e não 19 anos.
Almir Garnier Santos: O ex-comandante da Marinha, condenado a 24 anos, afirma que a Primeira Turma não esclareceu seu “domínio funcional do fato” e pede que o colegiado aponte os “atos ou omissões concretos” que caracterizaram sua integração dolosa à organização. A defesa também alega “vícios” e “obscuridade” na dosimetria da pena.
Alexandre Ramagem: O deputado federal questiona elementos utilizados no julgamento, como registros da ferramenta FirstMile da Abin, que, segundo a defesa, seriam de acesso ao prédio e não ao sistema. O recurso também solicita a reversão da perda do cargo de delegado da Polícia Federal.
Mauro Cid não recorre e pede extinção da pena
Diferente dos demais, a defesa do tenente-coronel Mauro Cid, condenado a dois anos de reclusão após acordo de colaboração premiada, decidiu não apresentar embargos.
Segundo a Folha de S. Paulo, os advogados avaliam que a pena já foi integralmente cumprida, considerando o período em que Cid esteve preso preventivamente e submetido a medidas cautelares. A defesa peticionou ao STF pela extinção da punição do militar. “Proferida sentença, já cumprida a pena nela imposta, resta claro que não subsiste qualquer fundamento razoável para a manutenção de cautelares preventivas”, disse o advogado Cezar Bitencourt ao STF na sexta-feira (24).
O ministro Alexandre de Moraes ainda não analisou o pedido de extinção da pena, mas autorizou que Cid participe da festa de aniversário de 90 anos de sua avó no próximo sábado (1º).
Próximos passos
Segundo apuração da TV Globo, a Primeira Turma do STF deve começar a julgar os recursos de Bolsonaro e dos outros seis réus entre os dias 7 e 14 de novembro. A expectativa é que o julgamento ocorra no plenário virtual, sistema onde os ministros inserem seus votos eletronicamente sem sessão presencial.
A Primeira Turma é composta pelos ministros Flávio Dino (presidente), Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. O ministro Luiz Fux pediu transferência para a Segunda Turma, e ainda não há informação oficial se ele participará da análise dos recursos.
Após a análise desses embargos, as defesas ainda podem apresentar um segundo tipo de embargo de declaração. O entendimento do Supremo é que, se novos recursos forem considerados protelatórios (com intenção de atrasar o processo), o tribunal pode determinar a execução da pena, ou seja, o início do cumprimento da prisão. A previsão é que as prisões possam ocorrer ainda este ano.
* com informações de Agência Brasil, CartaCapital, TV Globo e Folha de S. Paulo


















