Se o movimento paralímpico agregasse competições de esportes radicais ao seu calendário, o Brasil já teria um representante. Classificado para quatro provas da natação nas Paralimpíadas de Londres, Carlos Farrenberg, o Carlão, é daqueles que fazem da água seu habitat e já tem programação definida para quando voltar de Londres: trocará a piscina pelo mar, para, após longo período de treinamentos para os Jogos, reencontrar o surfe e o mergulho.
Deficiente visual, o paulista de Santos disputa os 50m (foi sexto), 100m (oitavo) e 400m livre e os 200m medley da classe S13, para atletas com menor perda de visão. Mas revela que o cilindro e a prancha estão separados e prontos para serem usados assim que retornar ao Brasil.
– Quando não estou treinando, vou fazer outros esportes. Meu técnico até sugere isso para que eu consiga dar uma desligada. Acaba que eu fico sempre na água. O surfe, o mergulho… Tudo isso sempre fez parte da minha vida. Tenho um tio que faz caça submarina e aprendi. Também gosto de pescar. Tudo que é ligado ao mar eu gosto.
O litoral paulista, por sua vez, é apenas o porto seguro do paralímpico radical. Na natação desde quando ainda era bebê, passando a participar de competições aos oito anos, Carlão é aventureiro e sempre que pode explora novos picos. O mais impressionante que já esteve foi Batsheba, em Barbados, quando seguiu a “sugestão” do melhor surfista de todos os tempos.
– É uma das praias preferidas do Kelly Slater, já li isso em revista. Foi legal, por ser fundo de coral, uma experiência que eu nunca tinha vivido. Para mergulhar também é fantástico. Tenho habilitação para mergulho autônomo desde os 14 anos. Então, acabo escolhendo um lugar para viajar que dê para fazer tudo. Também curto velejar com os amigos. Tento fazer de tudo um pouco.
Apaixonado pelo surfe desde a infância, Carlão passou por todas as etapas para deslizar sobre as ondas: começou com bodyboard, pulou para prancha e hoje se diverte com o pranchão. O desempenho, ele admite, não é suficiente para participar de competições, mas não o impede de traçar uma meta ousada para quando encerrar a carreira de nadador: aventurar-se no Havaí.
– Não dá, não dá. Não surfo tanto assim (para competir). É mais diversão. Nunca pensei em competição. Depois de um tempo, comecei a perceber que seria legal pegar onda de pranchão. Eu me apaixonei e nunca mais voltei para pranchinha. A sensação é incrível. Não tenho grandes pretensões de campeonato. Meus planos são de ir para lugares que nunca fui. Havaí, Indonésia… São lugares que já vi fotos e filmes. Essa é minha vontade.
Vontade acompanhada de uma boa dose de adrenalina. Mais do que descer as melhores ondas do mundo, o santista também quer as maiores.
– Falo com minha esposa que depois que terminar a carreira como nadador vou atrás de ondas grandes. Ela fica doida (risos). Diz que na hora que acha que vai passar a emoção, vai ficar ainda pior. Mas eu vou tentar.
No mar, Carlão deixa para trás a baixa visão usando a inteligência. Pela percepção dos movimentos dos outros surfistas, o brasileiro identifica para qual lado a onda está quebrando, ou até mesmo se deve remar em velocidade em direção à arrebentação para que não tome o famoso “caldo”.
– Muitas vezes, eu acabo prejudicado. Por isso, não gosto de ficar em algum lugar com muita gente para evitar acidente. Quanto maior o mar, pior. A onda fica mais rápida e acaba sendo perigoso. Eu procuro me ligar muito em quem está perto de mim. Se começarem a remar para fora, eu vou atrás, mesmo que não esteja vendo a onda.
Por fim, o nadador paralímpico elegeu seus ídolos no esporte e, obviamente, se dividiu entre surfistas e nadadores.
– O Kelly Slater é um ídolo para todo mundo que gosta de esporte. Outro cara que me inspiro é o Picuruta Salazar, que é lá de Santos e também pega onda de pranchão. Já tem mais de 50 anos e ainda é muito bom. Já tive o prazer de surfar com ele. Na natação, admiro o Cielo, Phelps…
Carlos Farrenberg ainda disputa mais duas provas nos Jogos Paralímpicos de Londres: os 400m livre S13, com eliminatórias marcadas para terça-feira, às 7h51m (de Brasília), e os 200m medley, na próxima sexta. Depois, será hora de trocar o cloro pela água salgada.
Fonte: GloboEsporte.com