A Polícia Federal (PF) apresentou as conclusões de uma investigação que identificou Jair Bolsonaro (PL) como peça central em um plano para abolir o Estado Democrático de Direito no Brasil. Segundo o relatório, o ex-presidente teve “plena consciência e participação ativa” em ações que visavam inviabilizar a transição democrática e impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.
Atos clandestinos e minuta golpista
De acordo com o relatório, Bolsonaro deu continuidade a práticas clandestinas que buscavam subverter a ordem constitucional. O ex-presidente teria promovido lives e reuniões para sustentar a narrativa de fraude nas eleições e desacreditar o sistema eletrônico de votação.
A investigação também revelou alterações feitas por Bolsonaro na chamada “minuta do golpe”. O documento original, entregue por seus assessores Filipe Martins e Amauri Feres Saad, previa a prisão de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), como Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, além de novas eleições presidenciais. Bolsonaro, no entanto, solicitou ajustes para manter apenas a prisão de Moraes e a realização de novas eleições.
Pressão sobre as Forças Armadas
O relatório descreve reuniões no Palácio da Alvorada em que Bolsonaro buscou o apoio das Forças Armadas para implementar o plano. Apesar do alinhamento de figuras como o comandante da Marinha, Almir Garnier, a resistência do comandante do Exército, Freire Gomes, foi decisiva para impedir o avanço do golpe.
Mensagens obtidas do celular de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, revelam que o então presidente pressionou o Exército para aderir ao plano, contando com o apoio de militares como o general Estevam Theóphilo, comandante de Operações Terrestres (COTER).
“Ademais, as ações de pressão ao comandante do Exército, como a denominada ‘Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa’, tiveram ciência e autorização para serem elaboradas e disseminadas por Bolsonaro”, afirma o relatório.
Preparação militar e apoio estratégico
O relatório também indica a existência de articulação militar para sustentar a ação golpista. O comandante da Marinha, Almir Garnier, considerado “patriota” por aliados, teria mobilizado tanques e veículos blindados para apoiar o intento. As mensagens obtidas pela PF sugerem que, caso a Marinha tivesse agido, outras forças poderiam seguir o mesmo caminho.
Em 2021, tanques foram levados ao Palácio do Planalto sob a justificativa de entregar um convite para exercícios militares, coincidentemente na mesma data de votação da proposta do voto impresso na Câmara dos Deputados. Garnier afirmou que a data foi uma “coincidência”, mas o episódio gerou questionamentos sobre o uso das Forças Armadas para fins políticos.
Planejamento de fuga
Outro ponto detalhado pela PF foi o plano de fuga de Bolsonaro para os Estados Unidos, elaborado em 2021 e adaptado em 2022. A operação, dividida em três etapas, incluía a cooptação de militares do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), a ocupação de estruturas críticas para pressionar instituições e a criação de uma Rede de Auxílio à Fuga e Evasão (RAFE).
Bolsonaro viajou para Orlando, nos Estados Unidos, em 30 de dezembro de 2022, onde permaneceu por três meses. A PF aponta que a fuga visava evitar uma eventual prisão no Brasil e aguardar os desdobramentos dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
O relatório final conclui que Bolsonaro “planejou, ajustou e elaborou um decreto que previa a ruptura institucional”, mas o plano foi frustrado pela falta de apoio militar. Os depoimentos de ex-comandantes das Forças Armadas, como Freire Gomes e Carlos Almeida Baptista Júnior, reforçam a tese de que a resistência do Exército e da Aeronáutica foi determinante para impedir a concretização do golpe. A investigação, que tramita no STF, aponta Bolsonaro como responsável direto pela tentativa de subverter o Estado Democrático de Direito. A defesa do ex-presidente nega as acusações e afirma que “não houve nada de golpe nem de prisão”.