Neste domingo, 7 de julho, é celebrado o Dia Mundial do Chocolate. Para marcar a data, o Em Dia ES conversou com Fernando Buffon, produtor rural e idealizador da Barcaça Chocolate Artesanal, uma referência na produção de chocolate de origem produzido em Linhares, no norte do Espírito Santo.
A cidade das lagoas também se destaca como a maior produtora de cacau do Estado e a 6º maior do Brasil, com 70,7% da produção estadual concentrada no município. No Sítio Dona Nita, onde é cultivado o cacau do chocolate Barcaça, a qualidade das amêndoas é reconhecida mundialmente, tendo recebido prêmios como o de melhor amêndoa do Brasil em 2020.
Fernando Buffon disse que a cultura do cacau começou no sítio com seu avô em 1963 e foi passada de geração em geração até chegar a ele, que há nove anos decidiu abrir uma fábrica para produzir chocolate artesanal. “Estamos tentando criar um legado, não é só sobre ganhar dinheiro, mas criar um legado que começou em 1963. Espero que meu filho, que tem dois anos e meio, continue esse legado se ele assim desejar”, conta Buffon.
A Barcaça utiliza um processo completo “da árvore à barra”, garantindo a qualidade desde o trato da lavoura até a produção do chocolate. A marca é conhecida por sua composição de 70% cacau e 30% açúcar de coco, sendo vegana e sem glúten.
Produzir chocolate artesanal de alta qualidade envolve vários desafios, como explica Buffon. Desde a fermentação, passando pelo trato da lavoura e a secagem, cada etapa do processo deve ser rigorosamente controlada para garantir a qualidade do produto final. “No início, o chocolate era amargo, muito ácido. Havia vários defeitos que tivemos que superar para padronizar a qualidade”, relembra.
Um dos grandes benefícios dessa produção artesanal foi a escolha de criar um chocolate sem leite, utilizando apenas cacau e açúcar de coco, o que diferencia o produto pela sua pureza e qualidade.
A qualidade do cacau de Linhares é reforçada pela Indicação Geográfica “Cacau de Linhares”, reconhecida pelo Ministério da Agricultura desde 2012. O município também é conhecido por suas amêndoas premiadas, como as do distrito de Povoação, que já foram destaque no Salão de Chocolate de Paris.
A produção de cacau no Espírito Santo envolve muitas famílias e agricultores, sendo 69% da agricultura familiar.
Buffon relata o impacto positivo na economia local: “A lavoura de cacau não é muito mecanizável, então precisa de muitas pessoas para fazer o trato, a colheita, a quebra, a fermentação. Gera muita riqueza e injeta muito dinheiro no mercado local.”
A expansão da Barcaça inclui vendas em várias localidades, como Rio de Janeiro e Minas Gerais, além de uma forte presença online. “Vendemos para o Brasil todo, temos algumas pessoas que compram para revender em outros estados e cidades”, diz Buffon. No entanto, ele pondera sobre o crescimento da empresa: “Não sei até que ponto quero crescer tanto. A Barcaça continua sendo uma empresa familiar artesanal.”
Em 2022, chocolates e preparados com cacau representaram 1% das exportações do Espírito Santo, com um crescimento de 28% em relação a 2021. Buffon vê essa valorização como uma tendência crescente.
“As pessoas estão valorizando produtos de alta qualidade, como aconteceu com o café e o vinho. Estão procurando chocolate de alta qualidade, com amêndoas de alta qualidade e a menor quantidade de ingredientes possível.”
Para o futuro, Buffon planeja melhorar a estrutura da loja, aumentar as vendas online e expandir a variedade de produtos, mantendo a qualidade e a essência artesanal da Barcaça. “Queremos aumentar a variedade de produtos, mantendo a qualidade e continuando a crescer de forma sustentável” conclui Buffon.
Confira a entrevista com Fernando Buffon na íntegra.
1. A Barcaça é uma referência em chocolate artesanal de origem. Pode nos contar um pouco mais sobre o processo “da árvore à barra” que vocês utilizam? Como foi o processo de transformar essa tradição familiar em um negócio de chocolate artesanal?
Fernando Buffon: Somos uma família que trabalha com cacau desde 1963. Começou com meu avô, depois meu pai assumiu, e agora eu trabalho junto com ele. Fazemos todos os processos, desde o trato da lavoura até a produção de chocolate. Já tem 9 anos que produzimos chocolate. Mas desde 1963 cuidamos da lavoura. Sobre transformar essa tradição familiar em um negócio de chocolate artesanal, foi um processo natural. Era uma tradição familiar trabalhar com cacau e cuidar da lavoura desde 1963. Tanto que nosso sítio se chama Sítio Dona Nita, em homenagem à minha avó, que comprou o sítio em 1963 com meu avô e começou a cuidar dele, criando os filhos enquanto cuidava da lavoura de cacau. É uma tradição que começou com meus avós, passou para meu pai, e hoje eu trabalho junto com ele. Estou tentando criar um legado, não é só sobre ganhar dinheiro, mas criar um legado que começou em 1963. Espero que meu filho, que tem dois anos e meio, continue esse legado se ele desejar. É isso que estamos tentando criar, continuar uma história de cacau e criar uma história de chocolate também.
2. O chocolate Barcaça é conhecido por sua qualidade e composição especial de 70% cacau e 30% açúcar de coco, sendo vegano e sem glúten. Quais foram os desafios e benefícios de criar um produto com essas características?
FB: Bem, no início, o chocolate era amargo, muito ácido, tinha vários defeitos. Já produzíamos cacau de qualidade, mas quando você começa a produzir cacau para transformar em chocolate, é um outro nível de trabalho. Você tem que elevar seu nível de fermentação, de trato da lavoura, de secagem, porque qualquer defeito nessas etapas é sentido depois na produção de chocolate. Então, no início, havia esses defeitos, tentamos padronizar, entre aspas. Digo entre aspas porque só se consegue padronizar até certo ponto. Você não consegue padronizar de fato o processo de chocolate artesanal. Consegue padronizar até certo ponto, mas daí em diante é o que dá o diferencial do chocolate. Fatores como clima, chuva, sol, e características do solo influenciam. Na medida do possível, estamos padronizando para sempre ter um chocolate de boa qualidade. Hoje, produzimos chocolate de altíssima qualidade, às vezes com algumas características diferentes, mas sempre de qualidade. Esse foi um desafio, manter o chocolate sempre com altíssima qualidade.
Os desafios foram desenvolver um processo e tentar replicá-lo da melhor maneira possível para sempre ter um chocolate de qualidade. Como falei, só se consegue padronizar até certo ponto, pois há fatores que não se consegue controlar, como o clima. Esse foi um grande desafio. Estruturar a empresa, comprar máquinas e aprender sobre o processo também foram desafios.
Quanto aos benefícios, tive que escolher um nicho, pois quando abri a empresa só tinha uma máquina de beneficiamento. Tive que escolher entre chocolate ao leite e sem leite, por exemplo. Escolhi o sem leite, pois me obrigaria a fazer uma amêndoa de maior qualidade. O chocolate ao leite é maravilhoso, mas o leite mascara muitos defeitos das amêndoas. No chocolate sem leite, com apenas dois ingredientes, você sente todos os defeitos, se houver. Mantivemos a qualidade altíssima para que o chocolate sem leite tivesse a menor quantidade de defeitos possível. Foi uma escolha muito acertada, pois nos diferenciou com um chocolate nobre e de alta qualidade. Hoje, apesar de produzir vários tipos de chocolate, inclusive ao leite, 80% das minhas vendas ainda são do chocolate sem leite.
3. Linhares é um dos maiores produtores de cacau do Brasil, e a amêndoa produzida no Sítio Dona Nita já ganhou prêmios. Quais são os fatores que tornam o cacau de Linhares tão especial e reconhecido internacionalmente?
FB: Fomos eleitos como a melhor amêndoa do Brasil em 2020. O diferencial aqui é a tradição dos agricultores, gerações e gerações produzindo cacau com amor pela lavoura. Minha família é apenas um exemplo, estamos desde 1963 cuidando da lavoura. As características do solo e o clima também ajudam, contribuem para a qualidade do cacau. Mas é a tradição e a paixão das famílias que trabalham com isso, que passam de geração em geração. A expertise dos agricultores, as condições do solo, a Mata Atlântica, o clima, tudo influencia para produzir um dos melhores cacaus do mundo.
4. A Barcaça vende seus produtos em várias localidades, incluindo fora do estado. Como vocês têm expandido a presença de mercado e quais são os planos futuros para a marca?
FB: Hoje, a empresa é uma pequena empresa familiar artesanal. Nem sei se quero que isso mude. As pessoas valorizam muito a história do produto. Não querem mais padronização e quantidade, querem coisas diferentes, querem comprar a história do produto. Não sei até que ponto quero crescer tanto. A Barcaça continua sendo uma empresa familiar artesanal. Temos uma lojinha e a fábrica aqui no bairro Conceição, em Linhares. A fábrica está aqui no bairro Conceição, mas o início do processo é no nosso sítio, em Regência. Vendemos para o Brasil todo, temos algumas pessoas que compram para revender em outros estados e cidades. Mandamos para o Brasil todo, temos vendas online. Ainda estou avaliando até que ponto quero que a empresa cresça, pois não quero perder a qualidade e a característica familiar artesanal.
5. A produção de cacau em Linhares e em outras regiões do Espírito Santo envolve muitas famílias e agricultores. Como você vê o impacto da produção de cacau na economia local e na vida dessas comunidades?
FB: A produção de cacau e chocolate realmente tem um grande impacto aqui. É uma cultura tradicional na região, com muitos cacauicultores. Há plantações em pleno sol e embaixo da Mata Atlântica, chamadas de cabruca. Envolve muitas famílias. Na nossa sociedade, embora sejamos pequenos agricultores, temos um casal que trabalha conosco, têm filhos e vivem no cacau também. É um ambiente bem familiar. Eles são quase sócios da nossa fazenda, são uma família com três filhos. Existem médios e grandes agricultores aqui em Linhares, e o cacau movimenta muita gente. A lavoura de cacau não é muito mecanizável, então precisa de muitas pessoas para fazer o trato, a colheita, a quebra, a fermentação. Gera muita riqueza e injeta muito dinheiro no mercado local.
6. Em 2022, chocolates e preparados com cacau representaram 1% das exportações do Estado, com um crescimento de 28% em relação a 2021. Como você vê esse crescimento e quais são as expectativas para o futuro da Barcaça? Há planos de expansão ou novas linhas de produtos?
FB: As pessoas estão valorizando produtos de alta qualidade, como aconteceu com o café e o vinho. Estão procurando chocolate de alta qualidade, com amêndoas de alta qualidade e a menor quantidade de ingredientes possível. Chocolate de verdade, às vezes com apenas dois ingredientes: cacau e açúcar. Ao contrário daqueles chocolates com uma lista de 30 ingredientes que você nem sabe o que são. Aqui no estado, há muitas pequenas chocolaterias surgindo, e eu vendo amêndoas especiais para essas empresas. Todo mês, novos produtores de chocolate me procuram para comprar amêndoas. É importante inovar, produzir novos tipos de chocolates, atender vários nichos como pessoas com diabetes, intolerâncias, ou que buscam uma alimentação mais saudável. Está acontecendo uma busca maior por produtos de alta qualidade e com história.
Quanto aos planos futuros, queremos melhorar um pouco a loja, aumentar a estrutura, talvez aumentar as vendas online e fazer uma propaganda maior. Poucas pessoas ainda conhecem nossa marca. Queremos aumentar a variedade de produtos, mantendo a qualidade e continuando a crescer de forma sustentável.