Fenômeno faz parte do ciclo natural dos microrganismos; veja o que fazer para se prevenir das superbactérias
A resistência de bactérias aos antibióticos é um assunto que desperta curiosidade e também preocupação. Para se ter uma ideia, a Organização Mundial de Saúde (OMS) trata a questão como uma ameaça, uma vez que esse cenário dificulta o tratamento de várias doenças – desde as mais comuns, como infecção urinária, até condições mais graves, como pneumonia, sífilis e tuberculose.
Em primeiro lugar, é importante entender como funcionam os antibióticos. Este tipo de remédio possui diferentes mecanismos para combater o agente infeccioso, sendo que o principal deles age diretamente na parede celular das bactérias, segundo Alessandro Silveira, farmacêutico-bioquímico e professor titular de Microbiologia Clínica na Universidade Regional de Blumenau.
“A parede celular é uma estrutura rígida que tem como objetivo proteger a bactéria. Quando se multiplica, a bactéria se divide ao meio, esticando-se. O antibiótico, então, age na parede celular formando poros. Assim, quando a bactéria vai se esticar para se dividir, ela acaba arrebentando essa parede. Esse não é o único, mas é um dos mais importantes caminhos de ação dos antibióticos”, explica Silveira.
Outras possibilidades, de acordo com o professor, são os obstáculos criados pelo medicamento à síntese de proteínas nas bactérias e na replicação de seus cromossomos. Há também antibióticos que agem como bactericidas: ou seja, matam as bactérias diretamente.
Como bactérias se tornam resistentes a antibióticos
De forma natural, as bactérias criam mecanismos para tentar barrar sua extinção por ação dos antibióticos – o que as torna cada vez mais resistentes aos fármacos. Conforme explica Silveira, esses meios são bem complexos e podem ser explicados por diferentes motivos.
“A bactéria pode modificar o local onde o antibiótico vai se ligar a ela; pode inativar o antibiótico produzindo uma enzima; pode impedir que o antibiótico penetre na célula, fechando um poro ali existente para a entrada e saída de substâncias; pode expulsar o antibiótico depois que ele penetrar, em um mecanismo chamado bomba de fluxo”, exemplifica.
De acordo com o especialista, a bactéria adquire essa resistência por meio de elementos genéticos móveis, chamados plasmídeos. “Ela recebe essa informação genética que faz com que ela seja resistente aos remédios”, afirma o professor. Embora o processo de resistência leve tempo, ele enfatiza que o uso de antibióticos ajuda no processo.
“Ao usar antibióticos, existe uma pressão seletiva: o remédio mata todas as bactérias que são sensíveis e as que são resistentes não são mortas. Com isso, elas vão se multiplicando. E as bactérias se multiplicam de maneira muito rápida: a cada 20, 30 minutos, uma delas divide-se em duas”, afirma o especialista.
O que são superbactérias
Quando se fala em bactérias resistentes a medicamentos, uma expressão popular que surge relacionada ao assunto é ?superbactéria?. É importante entender que as superbactérias não são um tipo específico do microrganismo. Afinal, qualquer bactéria pode adquirir resistência aos antibióticos.
Na verdade, trata-se de um termo usado equivocado para denominar bactérias multirresistentes a antibióticos. “A palavra não é adequada, porque essas bactérias nem sempre são capazes de causar doenças. Tanto que podemos estar sendo colonizados por elas em nosso intestino e elas não estarem causando nenhum mal”, diz Silveira.
Tratamento para bactérias super resistentes
De acordo com Silveira, a incapacidade de tratamento das doenças causadas por bactérias multirresistentes já é uma realidade nas unidades de saúde. Para reverter esse quadro, as equipes médicas contam com estratégias especiais para contê-las.
“Hoje existem bactérias que são resistentes a todos os antibióticos. O que fazemos são engenharias do que existe disponível, mas nem sempre elas são bem sucedidas”, diz o professor.
Entre as possibilidades, Silveira cita o intervalo de tempo mais curto entre as doses do medicamento dadas ao paciente (diferente das tradicionais 8 horas ou 12 horas de intervalo), combinação de antibióticos, entre outros recursos.
Porém, a melhor estratégia ainda é a prevenção às bactérias multirresistentes. De acordo com Silveira, isso não significa a proibição do uso de antibióticos, mas, sim, a utilização correta do medicamento – como a própria OMS recomenda.
Entre os cuidados, estão:
– Tomar antibióticos nos horários certos
– Tomar antibióticos durante os dias prescritos pelo médico, com ou sem sintoma
– Não pedir e usar antibióticos sem necessidade
– Não usar antibióticos de outra pessoa
– Cuidados com possíveis infecções por parte da população e de agentes de saúde
“Lembrando que a resistência aos antibióticos é um fenômeno natural e não é passível de ser impedido. O que precisamos é, através de medidas de saúde pública, tentar prolongar o tempo de uso dos remédios. Quanto mais usar o antibiótico, mais nós vamos prolongar a resistência. Por isso, é preciso usar os antibióticos com critério. Hoje, felizmente, não há a venda livre desses remédios. Eles só são vendidos com receita médico e isso ajuda bastante”, finaliza o professor.