No capítulo, a traficada foge da escolta policial no meio da madrugada – mesmo sabendo que está na mira de uma poderosa quadrilha internacional – para ir à igreja.
Como por um milagre, encontra local aberto e dá de cara com o pai de sua filha – que acredita que ela estava morta. Por sua vez, o rapaz em nenhum momento leva um susto ao ver a “assombração”.
Desde a morte de Jessica (Carolina Dieckmann), assistir a novela das 21h tem sido uma forma de exercitar a fantasia e fazer vista grossa para os furos do roteiro.
Em nenhum lugar do mundo uma pessoa procurar sinal de celular dentro de um elevador após se apresentar para duas bandidas ou pede ajuda a um desconhecido ao invés de uma delegada amiga da família.
Nas palavras de Glória Perez, autora da trama, isso é saber voar. Só que a impressão que se dá é de que a escritora está abusando da boa vontade do telespectador.
É fato que a maioria dos problemas das mocinhas de novelas poderia ser resolvida em uma semana. Todo mundo entende que é preciso um pouco de fantasia para arrastar o drama por oito meses.
No entanto, para embarcar na história, é necessário o mínimo de coerência. Foi assim que “Cordel Encantado” convenceu o público com uma história sobre príncipes e princesas da Europa no meio do cangaço brasileiro na década de 20.
Em uma trama onde todo mundo parece não enxergar o que está a um palmo de seu campo de visão, a única personagem coerente é Heloísa. Talvez por isso, aliado ao talento de Giovanna Antonelli, é que a delegada tenha se tornado a protagonista da novela.
O que começou como um sério problema de roteiro e falhas de continuidade se tornou a tábua de salvação do folhetim. Os “viúvos” de “Avenida Brasil” encontraram um motivo para se render aos delírios da escritora e debocham de cada deslize da produção nas redes sociais. Assim, se tornaram telespectadores cativos da história que tenta fazer uma conexão entre Rio de Janeiro e Istambul.
Glória é a única autora da Globo que escreve suas novelas sozinha, sem colaboradores. É também a dona do único Emmy dado a uma novela brasileira – “Caminho das Índias” levou o maior prêmio da TV mundial em 2010.
Mas, também, é famosa por situações surreais em suas tramas. Quem não se lembra de Sol (Deborah Secco) tentando entrar nos Estados Unidos dentro do porta-luvas de um carro em “América”? Só para citar um caso recente.
Parece que dessa vez a escritora pesou a mão. Se a ideia é seguir a máxima do falem mal, mas falem de mim, está funcionando. A impressão que se dá é de que tem coisas que nem São Jorge salva.
Fonte: MSN.com.br